Século XXI. Embora tantos avanços sociais e tecnológicos, algumas questões, como a nudez, ainda configuram como tabu na sociedade. Mesmo nos deparando com ela diariamente, em momentos de intimidade (solo ou compartilhado), insistimos em ver com olhos tortos aqueles que se expõem com menos peças de roupas, seja nas telas, na arte ou na cidade.

E é sobre nudez – não erótica, clichê e vulgarizada – que vamos falar hoje. A nudez feminina sob os olhos de Pedro Vidal, fotógrafo e editor-chefe da revista airmag.co.uk.

Pedro é um apaixonado pelo corpo humano, suas formas e potência, e um especialista em retratar a beleza do corpo feminino com delicadeza e olhar de artista.

Neste bate papo incrível e esclarecedor, entendemos o limite entre o sexy e o vulgar, e a relação poética e respeitosa da arte com o elemento nu.

 

Artescétera: Como e por que você começou a tirar fotos de nudez?

Pedro: Nudez é um dos temas que me atraiu para o mundo da fotografia. Quando desenvolvi meu gosto pelo ballet e pela dança (veja o outro post de Pedro aqui), me senti atraído, sobretudo, pelo corpo humano, sua beleza, formas e potência. Um corpo, seja como for, parado ou em movimento, é bonito e expressivo.

 

Artescétera: As modelos procuram por você ou você procura por elas? Embora seja um trabalho consentido, é comum algumas delas apresentarem vergonha durante o ensaio? Se sim, qual técnica você utiliza para deixar a modelo mais à vontade no set?

Pedro: Muita gente me procura para ser fotografada. Porém, quase todos os ensaios que eu publico nas minhas redes sociais são de pessoas que eu convidei para fotografar (tento separar meu trabalho autoral da minha produção profissional).

Às vezes, acontece de rolar um pouco de timidez no começo de um ensaio, mas de uma maneira muito sutil. Quando você trata o assunto com naturalidade, como deveria ser, não existe constrangimento.

 

Artescétera: De todas as mulheres que você já fotografou, existe algo em comum entre todas elas?

Pedro: Vejo dois perfis frequentes: pessoas que querem seguir com a carreira de modelo, atriz etc, e outras (que não costumo publicar) que apenas buscam por um registro pessoal bonito. Assim como certas pessoas optam por ensaios de casal, gravidez etc, outras preferem ensaios de nudez para guardar de recordação, para extrair seu eu verdadeiro e se ver de outro ponto de vista.

 

Artescétera: Suas fotos retratam a beleza feminina sem vulgaridade. Na sua opinião, qual o segredo estético para alcançar este resultado?

Pedro: O segredo é criar a atmosfera adequada e saber o que você está querendo retratar. Quando fotografo uma pessoa nua, não fotografo suas parte íntimas, mas o conjunto de um todo: braços, ombros, costas etc. Tudo tem o mesmo valor das partes sexualizadas. Isto completa o que disse sobre intimidar a modelo. Uma vez que está claro que é um ensaio sobre o corpo, a modelo e a verdade, e não sobre alimentar desejo e sexualidade, o ambiente já ganha outro clima. Quanto à estética, gosto de usar contrastes de sombra e luz para complementar formas e desenhos, e também ocultar o desnecessário. Fotografar é entender a luz.

 

Artescétera: Na fotografia, o que você acredita ser o limite entre o sexy e o vulgar?

Pedro: A direção do fotógrafo, a atitude da modelo, as decisões no momento de ambientar, compor, focar etc. Não se trata do que está sendo mostrado, mas como.

Já aconteceu de eu trabalhar com modelos que estão acostumadas com ensaios sexys e estas, às vezes, é difícil mudar o clima. É mais fácil trazer alguém sem experiência para uma atmosfera mais natural que alguém condicionado à vulgaridade. O mesmo vale para os fotógrafos. Já acompanhei vários, que mesmo com modelos de personalidades diferentes, acabam levando a estética para o lado vulgar. Vícios.

 

Artescétera: A nudez ainda é considerada um tabu, mas já evoluiu muito do que era há alguns anos. Como as pessoas encaram este tipo de projeto atualmente? Você se depara com muito conservadorismo?

Pedro: Vejo muito mais resistência no lado masculino que no feminino. Eu, por conta do meu trabalho, acabo me aproximando de ambientes onde tudo isso é muito natural, até mesmo por viver em um país (Espanha) que trata este assunto com mais naturalidade (embora de maneira muito contraditória) que no Brasil.

Por outro lado, mais pessoal, me entristeço quando encontro com pessoas, que conheço desde pequeno, e o primeiro comentário é sempre algo machista sobre o fato de eu lidar com mulheres nuas, seja insinuando sobre a minha sexualidade, minha relação com as pessoas que eu fotografo ou o privilégio do meu trabalho. Sei que ainda há muita resistência sobre este tema, mas vejo de maneira positiva, porque, de alguma forma, ela também é reflexo de pessoas que estão criando choques e produzindo coisas sem pensar na manutenção do status quo falido que seguimos há séculos.

 

Conheça também o outro projeto de Pedro, Before the Storm.