[texto de Rebeca RiHensa – @bekyrhs]

Apesar do nome, Notre Dame pouco tem haver com o aclamado filme da Disney (mesmo com a existência de uma breve referência), ou ao menos discorre o incidente de 15 de abril de 2019, que levou a Catedral de 850 anos a pegar fogo, embora a trama nos leva relembrar deste triste fato.

A comédia romântica da francesa Valérie Donzelli que dirigiu, roteirizou e protagonizou o filme, conta a história de Maud Crayon. Uma arquiteta, mãe de dois filhos, que vê sua vida virar de ponta cabeça quando descobre que está grávida e responsável pela reforma do pátio diante da catedral de Notre-Dame, após inexplicavelmente ganhar um concurso promovido pela prefeitura de Paris. Diante dessa nova missão, Maud se vê tendo que lidar com a novas responsabilidades e  ao mesmo tempo que vivencia um triângulo amoroso com o pai de seus filhos e um antigo amor.

O longa aborda temas como a supervalorização do sacro em detrimento da arte contemporânea, a importância da arte atemporal e a dificuldade que a população tem em aceitar o novo. Com notórias referências ao artista Daniel Buren, responsável pelas 200 colunas no pátio do Palácio Real (Paris), que foi perseguido por suas ideias conceituais, assim como a protagonista do filme.

FILME ESTRANHO PRA GENTE ESQUISITA – IRREVERSÍVEL

A cineasta também questiona os limites da arte, além do tema estar explícito no arco da personagem principal e em acontecimentos cotidianos incomuns (como o estranho homem que distribui tapas entre desconhecidos na cidade). Ela aborda essa questão em escolhas técnicas que para muitos podem parecer duvidosas. Com um tom sarcástico ela apresenta cenas que em um primeiro momento  parecem não fazer sentido, usando atuações teatrais que fogem totalmente da proposta inicial do filme com cenas de dança e músicas. Além de inserir elementos aparentemente mágicos sem nenhum tipo de explicação.

Alguns dos temas que Donzelli expõe podem não ser compreendidos na hora, o que pode deixar algumas pessoas confusas com a dinâmica do filme que requer um pouco de sensibilidade para ser absorvida. Isso pode ser visto como algo positivo para aqueles que, como eu, amam mergulhar em camadas filosóficas, entretanto há possibilidades de ser entediante aos que esperam uma comédia romântica convencional. Definitivamente esse não é um filme feito para agradar a todos.

Valérie optou explicitamente pela entrega da mensagem, o que a meu ver, comprometeu partes do roteiro, principalmente o arco da protagonista com um triângulo amoroso que muitas vezes não convence e, cenas questionáveis feitas intencionalmente para causar um certo desconforto. Porém, os mesmo são a base que fortalece os pontos levantados pela cineasta em relação aos limites que barram artistas e o estranhamento ao novo.

Notre Dame foi indicado aos prêmios Prix du Public UBS, Variety Piazza Grande Award e vem agradando a crítica internacional.